Pergunta-me respostas sabor a mar
Sim, pergunta-me respostas

Pergunta-me
se ainda és o meu fogo
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas
a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue

Pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos

Pergunta-me
se te voltei a encontrar
de todas as vezes que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu
que reunias pedaços do meu poema
reconstruindo
a folha rasgada
na minha mão descrente
Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer

Mia Couto
Solar Nature
7 Comments:
Não existem perguntas para tantas respostas...nem já nada resta para que tanto se possa perguntar. As pontes são passagens "para outras margens". E... "se perguntares, ao sol, à lua, ao vento (...)eles responder-te-hão que são horas de te emebedares... de amor, paixão, poesia, vinho, à tua escolha".
Muitas referências a revelar o evidente...desfragmentação calculada. Pois! Vai na mesma linha do anteriore um prego não se tira com um novo prego, se me percebes..beijinhos de boa noite, isto é, Beijinhos no fom-fom de Osiris!
Eu adoro Mia Couto, Ximpinhas. '..se acendes ainda o minuto de cinza', 'Pergunta-me se te voltei a encontrar de todas as vezes que me detive junto das pontes enevoadas' - que bonito... Obrigada por mais um momento tão bom... :) Um beijo enorme!
Está fenomenal este excerto:) ...perguntas sem resposta... adorei as imagens estão fantasticas..as vezes algumas perguntas são como as alforrecas:) beijocas
Muito boa a tua escolha, kikosss! Mil tilesss para ti! :)
Se o Homem fosse possuidor de todas as respostas não seria tão bela a nossa essência, nem o amor, penso que é isso que temos de aceitar, o facto de não existirem todas as respostas.. Beijinho, grande..
Pharaoh...das cinzas não se faz fogo..a não ser que este nunca tenha expirado. Este poema do Mia Couto é de uma tristeza imensa, o chorar de algo bom que se perdeu, o implorar saudades...desculpa a minha leitura contrária às restantes: este poema fala de algo que simplesmente morreu...beijinho
Bonita escolha...
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